Fonte: 3 Março 2008, Diário Insular
ESPERA DE DOZE MESES E MUITA VONTADE DE JOGAR
Nuno Vieira, veste, agora, a camisola do Matraquilhos
"Uns esperam, outros desesperam. Nuno aguardou nove meses por uma operação e a ânsia de regressar custou-lhe caro."
Luís Almeida DI
"O termo de comparação é o tempo de espera. Enquanto Gonçalo, como se conta na peça ao lado, apenas necessitou de cinco semanas para dar início ao tratamento necessário para debelar uma rotura do ligamento cruzado anterior e menisco, Nuno Vieira esteve quase um ano à espera de uma operação após ter contraído lesão idêntica, ficando à mercê de todas as consequências que daí pudessem advir.
O calvário de Nuno começou na época 2004-2005, quando defendia as cores do Barreiro no regional terceirense. Em Dezembro de 2004, numa partida diante do Belém, um toque lateral afectou-lhe profundamente o joelho esquerdo, o mesmo que já tinha causado problemas no final da temporada de 2003-2004, quando a turma do Porto Judeu competia na Série Açores.
Lesão no ligamento cruzado anterior. Um traumatismo grave, numa espera de cerca de nove meses. Nuno Vieira só haveria de ser operado em Setembro de 2005, na Clínica do Bom Jesus, em S. Miguel, e não tem dúvidas em afirmar que esta demora se deve a toda uma incompreensível burocracia que envolve o seguro desportivo. “O meu processo terá ficado esquecido numa qualquer gaveta”, desabafa, ao mesmo tempo que enaltece a postura do Barreiro, que terá agido com rapidez e prontidão.
“Não quero culpar ninguém, mas penso que as coisas poderiam ter sido diferentes se o tratamento tivesse chegado a tempo e horas. Aliás, a recuperação pós-cirúrgia foi extraordinária, sempre com um fantástico acompanhamento em termos de fisioterapia”, acrescenta.
Vontade fatal
Não foi um percurso fácil e Nuno Vieira não consegue disfarçar um misto de mágoa, de rancor e de algum arrependimento quando recorda esta trajectória. Que foi curta, refira-se, para um jogador que chegou a dar nas vistas. Aos 25 anos, Nuno sabe que na ala-esquerda do ataque já não existe espaço para ele. Mas o entusiasmo continua lá. E o sonho também. A vontade de pontapear a bola tem sido mais forte e isto tem-no prejudicado.
Formado no Belém, Nuno Vieira conta que, numa semana, teve quase todos os clubes da Terceira à sua porta, “cada um com uma proposta diferente”. Acabaria por ingressar no Grupo Desportivo e Recreativo da Agualva, onde se sagrou campeão regional de juniores
na época de 2001-2002.
É a partir daqui que os caminhos se tornam mais sinuosos. Entre ter sido impedido de prestar provas no Lusitânia, quando já se encontrava no balneário e devidamente equipado, e uma promessa não cumprida de realizar testes no Angrense, acabaria por ficar sem clube e rumou ao Barreiro. Entretanto, as lesões nunca mais o deixaram até que, em Dezembro de 2004, tudo se desmoronou.
Nuno confessa que, após a lesão, regressou demasiado cedo à competição. Isto foi fatal. “Hoje arrependo-me, pois gostaria de estar no futebol. Se me tivesse sido possível realizar uma época
inteira em perfeitas condições, estou certo que alguém iria reparar no meu valor. Atingi um dos meus objectivos, que era jogar na Série Açores, mas foi num ano amaldiçoado por lesões”, refere.
A vontade era mais forte e Nuno não resistiu aos encantos da bola. Caiu na ilusão e em Janeiro de 2006, quatro meses depois de ser operado, voltou à competição. Um acto irreflectido, porventura, num sentimento mais forte que a razão e que lhe atirou, novamente, para a mesa de
operações. Desta vez “doeu” mais. Do bolso “voaram” cerca de 4.000 euros…
Comparando com o caso de Gonçalo, Nuno não tem dúvidas em frisar que as condições que o Angrense oferece são fundamentais. “Com outro tipo de acompanhamento e, acima de tudo, aconselhamento, talvez não me tivesse auto-prejudicado. A primeira pessoa que tenho de culpar sou eu, pois não soube esperar. Esta vontade desmedida foi totalmente prejudicial e vejo o futebol cada vez mais longe”.
Nuno reconhece que, actualmente, não consegue suportar cargas físicas. Sente os músculos atrofiados e, sempre que joga, as dores são inevitáveis. Não seria melhor parar? O silêncio é a primeira resposta à pergunta. Um silêncio que soa a saudade: da companheira “redondinha”, do cheiro a relva e a suor, da festa da golo, da alegria da vitória, da tristeza da derrota. A segunda resposta surge segundos depois, claramente mais consciente. “Infelizmente, já não me revejo como jogador e o melhor para mim era, de facto, parar. É a opção mais inteligente”.
Por agora, Nuno Vieira é jogador do Matraquilhos Futebol Clube, o novel clube que compete nas provas de futsal organizadas pela Associação de Futebol de Angra. Um ritmo competitivo mais baixo, mas que, mesmo assim, lhe ressuscita as dores no joelho após cada treino, no final de cada jogo. Não exagera, é certo, mas sabe que até isso é demais. Mas a bola lá vai lançando os seus feitiços e é impossível parar. É que Nuno,na verdade, apenas quer jogar futebol."